segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Perfume do que restou das meras memórias


Nenhum de seus tesouros pode ser guardado
Tudo o que você tem é demasiado pesado
Lembrar a sua vida é viver a sua morte
Viver sua ausência é esvaziar este instante

Então, em tom amadeirado, perfumo o papel
Viva-voz em branco a perfurar seu som num poema
As correntes que correm para me prender neste velho dilema
Destruo antes com um pincel as nuvens claras do céu

x X x X x

Inspiração musical para hoje...
The Piano Guys - A Thousand Years (cover piano e violoncelo)


domingo, 29 de setembro de 2013

Entre existência e linguagem


Linhas negras em folhas brancas
Palavras cintilantes em linhas negras
Parênteses invisíveis para ortografias que insistem simbolicamente em desbotar o brilho das cores não ditas
E tudo retorna ao obscuro pois a curva de Deus entorta absurdamente a retidão das faíscas dos meus pensamentos que se arriscam no fogo velado entre existência e linguagem
Escrevendo errado por linhas mais incertas ainda
para alguém palpitar a certidão da vida.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Confessionário particular


Estudante do último ano do Ensino Médio. Vestibular. Concorrência. 17 anos. Ansiedade. Muita ansiedade. Pressão. Cobrança. Eficácia. Poderia ter sido estas as causas para aquilo que deveria se configurar somente em um colapso emocional momentâneo.

“Ana Cláudia, você desconfia como tenha sido sua origem a este mundo?”, irrompia uma única vez a pergunta de Tereza à sua filha em meio ao barulho e tempo quente do trânsito em horário de pique, o que fazia aquele diálogo se perder na vertigem do tempo. Agora sim tal indagação materna desconcertante fazia inimaginavelmente sentido.

Não se poderia ter uma cena de histeria neste lugar sob determinadas circunstâncias. A verdade não sabia como se autoproclamar. Mas você sabe, por acaso, quem era aquele homem com poucos fios de cabelo que a jovem tinha acabado de dar um abraço no estacionamento do aeroporto? Bom, ele era seu pai.

Naquela noite de julho, época do caos aéreo pelo Brasil, Ana Cláudia descobria, então, que o pai que tivera antes de abrir os olhos para este hilário mundo, que viu seus primeiros passos, suas primeiras palavras, seu desenvolvimento como ser humano durante a vida não era o que a fizeram acreditar como na fotografia do porta-retrato da família. Era aquele desconhecido gentil, na verdade, seu pai biológico.

O que pôde fazer a moça diante daquela verdade que era melhor nunca ter sido revelada? ¨Não!”, única palavra gritada que conseguiu dizer diante do reflexo que acreditava como real se perder para que existisse uma falsa representação de família tradicionalista por excelência. Para que existisse, enfim, a verdade em verdadeiro ângulo. Bipolaridade.


sábado, 21 de setembro de 2013

Segundos



À primeira vista, eu não quis entrar nesta fábula
Eu que passo por tantas ruelas desconhecidas
Eu que não passo de memórias distorcidas

Venho primeiramente agora rasgar o verbo
Cuspir três pontos finais em uma confusa caligrafia
A verdade não é sonho para o fim do túnel...

Tanta luz a nos ofuscar...
Nesta nossa intensidade e ternura
Minutos a se concretizarem em anacrônicos segundos

Este é o tempo que cega as trevas em meu peito
Eu que não sei recompensar o seu amor
feito singelos flocos de neve a caírem

Aquilo que nos pareceu inesquecível
Aquilo que só poderá ser uma promessa feliz
Sou sua segunda vez